Rumo à COP 30, um resumo do que foi o ATL em Brasília

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Lançamento da Comissão Internacional Indígena para a COP 30 durante o ATL 2025, com a presença das ministras Sônia Guajajara (MPI) e Marina Silva (MMA). Foto: Débora Menezes

Maior mobilização indígena brasileira, o Acampamento Terra Livre (ATL) é também espaço para a articulação entre os povos, seus parceiros e outras organizações da sociedade civil e ligadas ao Poder Público, interessados nos direitos indígenas e na proteção de seus territórios. E em 2025, a COP 30 e a participação das mulheres amazônicas foram alguns dos destaques da programação da 21ª edição do ATL, que ocorreu durante a semana de 7 a 11 de abril e reuniu mais de seis mil indígenas em Brasília (DF).  

A mensagem principal dos participantes do ATL é a necessidade de demarcar todos os territórios. “Nós, povos indígenas, seguimos em luta para que a Constituição seja respeitada. Isso passa pela garantia e implementação de nossos direitos, pelo respeito às instituições e pela escuta ao movimento indígena. Só assim poderemos fortalecer, de fato, a democracia brasileira”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que organiza o ATL.  

O direito à educação e à saúde, misturado aos cantos e danças indígenas, também foram temas das bandeiras e faixas levados nas duas marchas realizadas nas ruas de Brasília na semana da manifestação. Assim como fez parte do desfile, também, uma réplica da estátua da Justiça com um cocar indígena, carregada pelos manifestantes durante o ato – em protesto à inconstitucionalidade da Lei 14.701, que instituiu o critério do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Uma dessas manifestações no dia 10, infelizmente, foi recebida com repressão por parte da Polícia Legislativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e da Polícia Militar. 

Povos Tikuna do Alto Solimões (AM), concentrados para as atividades. Foto: Débora Menezes

A demanda pelas demarcações dos territórios foi o tema mais falado no ATL e ganhou oficialmente mais espaço dentro da pauta do evento ambiental mais importante a ser realizado no Brasil, desde a ECO-92: A COP 30, ou 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que reunirá líderes mundiais para discutir e negociar ações para combater as mudanças climáticas em novembro, em Belém (PA).  

Durante o ATL, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) anunciou a criação de uma Comissão Internacional Indígena para a COP 30. O lançamento teve participação da ministra Sônia Guajajara (MPI), de Marina Silva (MMA) e do embaixador André Correa do Lago, presidente da COP 30. Mas para além da iniciativa governamental, o movimento indígena reforçou, durante a programação, três temas centrais para a COP: o reconhecimento da demarcação e da proteção dos territórios indígenas como política de combate às mudanças climáticas; o financiamento climático direto para organizações e projetos indígenas; e ainda a participação plena e com poder de decisão dos povos indígenas nas negociações sobre o clima que ocorrem antes mesmo da COP em novembro. 

“Estamos à beira de um colapso e de um ponto irreversível. Nós, povos indígenas, sabemos como cuidar e “esfriar” o mundo”, defendeu, em seu discurso, Patrícia Suarez, liderança da Organização Nacional dos Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (OPIAC). A OPIAC é uma das nove organizações indígenas da Bacia Amazônica do chamado G9, uma aliança para fortalecer as demandas comuns dos povos indígenas da Amazônia e aumentar a pressão sobre governos por ações climáticas efetivas. Essa iniciativa foi lançada em 2024, durante a COP16 (Convenção da ONU sobre Biodiversidade) em Cali, na Colômbia, e reuniu-se novamente no ATL para planejar os próximos passos rumo à COP 30. 

As mulheres da UMIAB e os parceiros de caminhada, no último dia da assembleia.
Foto: Débora Menezes

Eleição da UMIAB – Este ano o ATL também recebeu a assembleia para eleição do mandato 2025-2028 da União das Mulheres Indígenas da Amazônia (UMIAB), organização que recebe apoio da ACT-Brasil para o seu fortalecimento institucional. Cerca de 90 mulheres de todos os estados amazônicos participaram de dois dias de programação. 

As componentes da nova gestão são Marinete Tukano (AM, coordenadora geral); Maura Arapium (PA, vice coordenadora); Mabel Apurinã (AM, secretária); Aldenicia Wapichana (RR, vice-secretária); Telma Taurepang (RR, tesoureira); e Inara Sataré-mawe (AM, vice-tesoureira). 

Temas como a necessidade de fortalecimento institucional e a violência contra a mulher indígena estão entre as necessidades apontadas pelas mulheres para serem trabalhadas em todos os territórios onde a UMIAB está presente.  “Nossa prioridade agora é fazer um plano de ação e fortalecer nossas coordenadoras e as nossas bases, que precisam de formação administrativa e, também, política” avisa a nova coordenadora geral, Marinete, que faz parte da Rede de Mulheres Indígenas do Estado do Amazonas (Makira E’ta). 

Para Telma Taurepang, que coordenou a UMIAB durante oito anos, o que fica como herança de sua gestão foi a visibilidade ao movimento das mulheres amazônicas. “Nós precisamos dessa visibilidade para a luta das mulheres indígenas, que é a de persistir naquilo que acreditamos”, diz Telma.  

No último dia da assembleia da UMIAB, houve a apresentação de parceiros da organização para a nova coordenação. O diretor da ACT-Brasil, Luiz Claudio Lopes, apresentou brevemente a iniciativa do programa Formação Política, Direitos e Proteção das Mulheres Indígenas da Amazônia brasileira, que foi construído com a participação de Telma e de outras mulheres do movimento, e deve trazer ações para o enfrentamento de violências e vulnerabilidades junto a meninas e mulheres indígenas. 
 

Em marca nas ruas de Brasília, pela demarcação e outros direitos. Foto: Débora Menezes

Apoio para a incidência – Desde 2021 a ACT-Brasil apoia a articulação e a participação indígena em mobilizações de interesse dos povos parceiros, uma vez que espaços como o do ATL são propícios para articulações, trocas de conhecimento e mesmo reuniões de trabalho. Geralmente, as organizações parceiras reúnem-se com suas lideranças antes do ATL e coletivamente definem quem irá representar sua região ou território. Em 2025, a ACT-Brasil apoiou a vinda de 30 lideranças da Amazônia Brasileira, seja com passagens, seja com barracas e cobertores, já que o próprio espaço do ATL serve como local de hospedagem para grande parte dos indígenas que vêm ao evento. 

A cacica Edilene Garcia Lopes, da etnia Kaixana, veio para Brasília em 2025, pela primeira vez em um ATL, indicada pela presidente da Federação das Organizações dos Caciques e Comunidades Indígenas Ticuna (FOCCIT),  Eraldina Tikuna. A aldeia de Edilene se chama São Francisco e fica em Tonantins, no Alto Solimões, pouco mais de 800 km de Manaus (AM).  

“É um sonho de muitas lideranças chegar ao ATL e lutar pelo seu povo”, diz a cacica, explicando que “sentimos o prazer de estar com outros parentes, ver pessoas que estão dispostas a sair do seu conforto para se expressar, sem discriminação com outros povos. É uma honra vir de tão longe para participar”. Edilene contou que espera retornar para a aldeia revigorada, trazendo informações sobre direitos indígenas para a aldeia onde vive. 

A analista de campo da ACT-Brasil, Nathalia Sibuya, citou em reportagem da revista Wanaki a importância de apoiar a vinda de pessoas como a cacica para mobilizações como o ATL. “É fundamental o apoio às lutas e aos povos, que saem de seus territórios e atravessam longas distâncias para participar de frentes de mobilização e de resistência. Isso faz parte do nosso trabalho, complementa o que fazemos no chão da aldeia”, lembra a analista.