“Não podemos mais ser os muros que protegem o mundo”, diz Juliana Kerexu durante encerramento do ATL 2023
Durante a cerimônia, foi anunciada a homologação de seis novas TIs e assinados os decretos de implantação do comitê gestor da PENEGATI e do CNPI

Após cinco anos sem demarcações de Terras Indígenas (TIs), nesta sexta-feira, 28 de abril, foi anunciada a homologação de seis novas TIs. A notícia foi divulgada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a cerimônia de encerramento do Acampamento Terra Livre, realizado desde segunda, dia 24, na capital federal. Além das novas TIs, também foram assinados dois decretos que implementam importantes instrumentos para a execução das políticas indigenistas no país.
Um deles institui o comitê gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PENEGATI), composto de forma paritária pelo poder púbico e organizações indígenas. O outro reestabelece o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), órgão consultivo da sociedade civil para as políticas indigenistas do país. Foram homologadas as Terras Indígenas Arara do Rio Amônia (AC), Kariri-Xocó (AL), Rio dos Índios (RS), Tremembé da Barra do Mundaú (CE),Uneiuxi (AM), Avá-Canoeiro (GO).
Juliana Kerexu Guarani, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), iniciou seu discurso dizendo que aquele era um momento histórico, mas que é necessário mais do que políticas para a garantia de direitos territoriais, justiça ambiental e climática. “Esse Acampamento Terra Livre é nosso, mas estamos aqui relembrando sempre que a nossa luta não é só nossa. Enquanto não houver uma consciência de toda a população de que a luta dos povos indígenas é de todos, a gente não poderá mais ser esses muros que protegem todo o mundo. Somos nós os corpos impactados todos os dias, somos nós que passamos por toda violência e por todos os impactos das mudanças climáticas”, discursou.
Em sua fala, o presidente Lula reforçou a importância da proteção dos territórios indígenas para que o Brasil alcance a meta de zerar o desmatamento da Amazônia em seis anos. “A gente vai ter que trabalhar muito pra fazer a demarcação do maior número de terras indígenas que pudermos nesse mandato. Não só porque é um direito de vocês, mas também porque se a gente quer chegar em 2030 com desmatamento zero na Amazônia, vamos precisar de vocês como guardiões da floresta”, disse.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), cerca de 95% do desmatamento na Amazônia é ilegal. A proteção dos territórios indígenas e de outros povos e comunidades tradicionais é uma das estratégias defendidas para a conservação da sociobiodiversidade brasileira, combinada com o estímulo a atividades produtivas sustentáveis às populações locais e o combate e controle do avanço de atividades ilegais nessas áreas.
Em entrevista à ACT-Brasil, Raoni Raoni Metuktire falou que seu maior sonho é ver os povos indígenas do Brasil reunidos em uma mesma luta pela defesa dos seus direitos e pela demarcação de seus territórios ancestrais. De acordo com Raoni, que é uma das principais lideranças indígenas do país, a proteção territorial é o principal caminho para a interrupção dos conflitos socioambientais em territórios indígenas no Brasil.
“Nós temos uma relação muito forte com a natureza. A gente considera a terra como nossa mãe, porque é de lá que a gente tira nossa alimentação. Temos vários povos de diferentes línguas e costumes que estão lutando para demarcar seu território tradicional pra continuar com suas culturas, suas línguas e manter as tradições da sua ancestralidade”, comentou.

Em seu depoimento, o pediu aos não indígenas que parem a exploração predatória que ameaça o planeta e as vidas dos povos indígenas brasileiros. “A gente considera a terra nossa mãe e vocês, que são os não indígenas, têm que respeitar. Muitos parentes e lideranças estão sofrendo ameaças por conta da falta de demarcação de terras indígenas. O governo tem que garantir a demarcação dos territórios para evitar novos conflitos e evitar essas ameaças e violências”, finalizou.
Em seu discurso durante o evento, o presidente cumprimentou Raoni dizendo que ele representa o “decano” dos povos indígenas vivos no país. Com 93 anos, o cacique Kayapó é reconhecido internacionalmente por sua história de luta e resistência pela conservação da Amazônia e em defesa dos povos originários.